Para garantir a motivação certa dos administradores, é necessário que as empresas tenham a coragem de alterarem o sistema de remuneração. Os prémios e os salários devem estar ligados ao cumprimento de objetivos associados à sustentabilidade no médio e longo prazo. Esta é uma verdadeira questão de “governance”.
Nos diversos pilares relacionados com a sustentabilidade, a temática ambiental leva normalmente a dianteira. É a questão mais estudada, debatida e falada pelos diversos “stakeholders”, o que é compreensível dado que vivemos em emergência climática. O ano passado foi marcado pela temperatura média do planeta mais elevada desde que há registos e também por mais um recorde na emissão de gases com efeitos de estufa. Depois, vem normalmente a temática social nas suas diversas vertentes: o respeito pelos direitos humanos, a defesa da diversidade nas organizações, a defesa dos direitos dos trabalhadores,…
Já a “governance” é o tema mais esquecido. Uma espécie de elo mais fraco. Arrisco dizer que erradamente. Sem uma “governance” correta, as transformações nos outros pilares da sustentabilidade vão avançar mais lentamente, a uma velocidade insuficiente para atingirmos os objetivos dos Acordos de Paris.
A mais recente regulamentação europeia é uma boa imagem das prioridades na área da sustentabilidade. A taxonomia europeia pretende sobretudo identificar os impactos das diversas atividades económicas na área ambiental e social. Ou seja, pretende fazer uma classificação entre atividades “verdes” e “castanhas”. A diretiva de reporte de informação não financeira e a diretiva relativa ao dever de diligência das empresas em matéria de sustentabilidade colocam também o acento tónico nos pilares ambiental e social. Obviamente que os temas de “governance” estão incluídos, mas nota-se um menor foco nestas questões por parte da Comissão Europeia.
Este caminho tem lacunas substantivas porque, sem um forte envolvimento das lideranças, a transição das empresas para sustentabilidade será mais lenta. Sendo mais claro: a sustentabilidade tem de ser um tópico presente diariamente na agenda do CEO, caso contrário pouco vai acontecer para além de promessas fáceis. Quantas vezes falamos com os responsáveis máximos das organizações que nos dizem ter grandes preocupações com os temas ambientais e sociais, porém esses tópicos acabam remetidos para um diretor de sustentabilidade ou para o departamento de risco.
A sustentabilidade deve ser um tema da administração, por forma a garantir mais ambição na abordagem a esta agenda transformadora. Basicamente, temos quatro tipos de atitude por parte das empresas: as que ainda ignoram estes assuntos; as que estão à esperar para ver as implicações para o seu setor de atividade; as que pretendem apenas cumprir os mínimos exigidos pela regulação; e as mais ambiciosas, que desejam transformar o seu modelo de negócios e focarem-se na inovação e comercialização de novos produtos e serviços sustentáveis.
Seria desejável que todas as empresas estivessem nesta última fase, mas isso depende precisamente dos CEO e dos conselhos de administração, pois são os responsáveis pela definição e implementação dos planos estratégicos das organizações. É certo que este caminho é árduo e cheio de obstáculos. A história de Paul Polman à frente da Unilever é paradigmática. Foi o CEO responsável pelo lançamento do ambicioso plano estratégico que pretendia transformar a gigante multinacional numa organização mais sustentável e acabou por sair ao fim de uma década sem ter completado a sua missão.
Para garantir a motivação do conselho de administração, é necessário que as empresas tenham a coragem de alterarem o sistema de remuneração. Os prémios e os salários devem estar ligados ao cumprimento de objetivos associados à sustentabilidade no médio e longo prazo. Esta é uma verdadeira questão de “governance” e toca num ponto fundamental para todos: o dinheiro que no final do dia levam para casa.
Artigo publicado no Jornal de Negócios
Ciências e Factos
Davos I – As reuniões do World Economic Forum, em Davos, juntam os mais importantes líderes mundiais e, por isso, é um momento importante para perceber as tendências. Este ano, em Davos, poucos falaram de ESG, preferindo sublinhar o tema Sustentabilidade. Confirma-se que a terminologia ESG tem hoje mais anticorpos que apoiantes, principalmente nos Estados Unidos.
Davos II – Ainda em Davos, a Sustentabilidade foi dos temas mais referidos, depois das questões geopolíticas e da inteligência artificial (IA). Uma das novas tendências, defendida este ano na reunião do World Economic Forum, é precisamente a junção entre a digitalização e as políticas de sustentabilidade. Ou seja, a digitalização, nomeadamente a IA, pode contribuir para o acelerar da descarbonização da economia.