Haja paciência
Conta-se na nossa vizinha Espanha a história de um empresário de sucesso e pai de família que depois de uma vida de grande sucesso profissional reuniu-se com os dois filhos e disse-lhes que chegou a hora de trabalhar menos e de começar a largar a empresa. Estava segundo ele na altura de pensar na sucessão. Os filhos ouviram-no atentamente e no fim um deles, um pouco atrapalhado, tomou a palavra e disse: “Pai! Eu e o João sabemos como esta empresa tem sido importante para si e para todos nós como família, mas o problema é que eu já tenho 70 anos e o João 72!”
O aumento da esperança média de vida gera cada vez mais situações complexas como esta com consequências ao nível das heranças e da sucessão nas empresas. A longevidade do ser humano e a manutenção por cada vez mais tempo das qualidades de pensamento, locomotivas e de trabalho levam a que facilmente numa empresa familiar possamos ter em simultâneo três e às vezes mesmo quatro gerações. Por outro lado, o prolongamento da presença das gerações mais velhas ao nível dos órgãos mais importantes de decisão leva a que as gerações mais novas acabem por construir a sua vida pessoal e profissional muitas vezes de uma forma completamente autónoma à empresa familiar sendo impossível, quando necessária, a sua integração no negócio. A busca cada vez maior do sucesso rápido e da consequente ascensão profissional esbarra na longevidade da geração acima ainda presente nos órgãos de decisão.
É por isso complexo este novo mundo em que várias gerações, com interesses diferentes e às vezes com construções profissionais diversas se vêm confrontados com a questão do futuro da empresa familiar e da sua sucessão. Se não houver a preocupação constante num processo de continuidade da empresa e da presença familiar na mesma, o futuro acaba por ditar ou a completa profissionalização do negócio com todos os desafios e riscos que isso apresenta para a estrutura familiar e para os detentores do capital, ou a venda do mesmo como forma de dividir o património por todos os herdeiros.
É, pois, importante, como em todos os assuntos da família nas empresas familiares, antecipar, prevenir e implementar. São processos longos e muitas vezes penosos, quer para quem prepara a sua saída, quer para quem espera e se prepara também, mas para a entrada. A coexistência de várias gerações é um desafio novo para as empresas familiares, mas se bem gerido, bem pensado e orientado pode ser altamente enriquecedor pela mistura de experiências, de competências, de vontades e até de sonhos.
Um dos maiores problemas das empresas é saber garantir a sua continuidade num ambiente de crescimento e desenvolvimento do negócio. Esta pode ser uma das grandes vantagens das empresas familiares. O facto de não terem somente gestores contratados a prazo torna possível que consigam olhar o futuro com maior capacidade de decisão e intervenção, e, portanto, têm todas as condições para melhor o prepararem. É evidente que como dizia um amigo meu as três grandes virtudes do ser humano são a paciência, a paciência e a paciência e se alguma destas faltar há que ter paciência. Num processo que é por natureza lento e que deve ser feito com sabedoria, calma e muita ponderação a família deve saber conversar, saber criar compromissos e saber encontrar consensos percebendo os diferentes interesses e vontades.
É o futuro da empresa que pode estar em causa, mas também é o futuro da família, das relações entre os seus membros e da afetividade entre todos. Nada pois mais aconselhável: que haja sempre paciência.
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