Pedro Alvito
Professor de Política de Empresa da AESE Business School e Diretor do Programa “Construir o Futuro nas Empresas Familiares”
Ter um filho é uma grande responsabilidade. Afinal vivemos numa sociedade que se preocupa muito com a responsabilidade parental. As preocupações com o crescimento, com a formação, com a saúde, com a subsistência saudável são comuns a todos os pais. Existem inúmeros estudos, livros incontáveis e até variadíssimos filmes sobre como ser bom pai ou boa mãe. Podemos até tirar cursos sobre este tema. Toda a nossa educação em termos culturais nos imbui do espírito de um dia sermos pais responsáveis, bons educadores e também conhecedores do mundo em constante mudança para melhor prepararmos os nossos filhos para a realidade do mundo de hoje e do amanhã. É importante referi-lo uma responsabilidade vertical como a de qualquer formador que com as ânsias de modernidade de muitos pais se transforma erradamente numa amizade horizontal de responsabilidade diluída ou inexistente.
Toda esta cultura transpõe-se naturalmente para as empresas familiares. A responsabilidade pela continuidade da empresa, pelo acompanhamento das futuras gerações, pela formação dos futuros acionistas e gestores e finalmente a preocupação com o processo de sucessão são tudo sinais de que os pais olham para os filhos e preocupam-se com o seu futuro. Até aqui tudo normal, tudo está estudado e é conhecido e bem ou mal todos fazemos algo para contribuir para o sucesso destas iniciativas nas nossas empresas.
Mas o que dizer da responsabilidade dos filhos? Será que o direito a trabalhar na empresa da família, o direito a ser futuro acionista e gestor e o direito a “decidir” sobre a empresa e o seu futuro são inexoráveis? Será que os filhos têm “apenas” e sempre direitos? E quais são as suas responsabilidades? Não existem?
Importa em primeiro lugar distinguir aquilo que em muitos casos confundimos: empresas familiares com negócios familiares. O filho que segue as pisadas do pai e continua o seu negócio não é uma empresa familiar. O médico filho de médico ou o carpinteiro filho de carpinteiro em que ambos seguem com a fama e até os clientes trazidos da geração anterior são um caso destes e claramente não se enquadra nas nossas preocupações.
Mas o que faz certos filhos acharem que os pais têm muita sorte em os ter como filhos e não que eles têm muita sorte em terem os pais que têm?
Sempre me preocupou de sobremaneira o conceito de filho do dono. É uma posição que não existe em nenhum manual de gestão nem em nenhum organograma de empresa, mas que infelizmente, na realidade do dia a dia, pulula em muitas empresas familiares por culpa em primeiro lugar dos pais que não definem responsabilidades e em segundo lugar dos filhos que querem mandar e mostrar a todo o custo que apesar de serem a futura geração, têm poder já no presente apenas porque são quem são. Infelizmente isto não traz nada de bom nem para a empresa nem para a família e muito menos para as pessoas envolvidas direta ou indiretamente com a empresa.
Ninguém é bem aceite pela força. A autoridade advém sempre de dois fatores: da posição e da competência. Não basta um deles. Posso ser CEO de uma empresa e nesse caso tenho a posição, mas se não tiver competência para o desempenho da função acabo por perder toda a autoridade. O contrário é naturalmente verdadeiro. Quanto à competência ela advém de características inatas (como a capacidade de liderar) e de características adquiridas (como seja a formação e a experiência). É todo um cocktail que bem elaborado produz um gestor de sucesso. Mas achar que ser filho do dono é posição e competência por força genética e familiar é um erro gravíssimo e perigosíssimo.
Nas empresas familiares tem que haver esta consciência nos pais e nos filhos. Nos pais tem de existir a capacidade para selecionar, preparar e formar quem é mais competente (seja filho, filha, sobrinho ou gestor externo) reconhecendo que o sucesso da continuidade da empresa não é um fator de consanguinidade, mas de competência. Nos filhos é fundamental a humildade! Humildade de reconhecer que nada se fez ainda por merecer tão grande dádiva e responder com dedicação, respeito, empenho, estudo e muito, muito trabalho. É o chamado fazer por merecer que nunca pode ser transformado em ter o direito por ser. A tirania dos filhos do dono é algo que tem que ser em primeiro lugar evitado e depois combatido ferozmente nas empresas familiares. Quando falamos de uma sucessão mal preparada e mal sucedida estamos também a falar deste problema tão real no mundo de hoje. O desejo de fama, de glória (nem que seja instantânea e efémera) e de poder é demasiadamente e erradamente sobrevalorizado e enfatizado face a valores tão mais importantes como sejam a humildade, o reconhecimento e o trabalho árduo.
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