"Caminhar sobre a água": um diálogo entre "fé, razão e política" - AESE Business School - Formação de Executivos

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Caminhar sobre a água: um diálogo entre fé, razão e política

02/05/2023

A AESE acolheu no dia 2 de maio de 2023, a apresentação da obra “Caminhar sobre a água: Fé, Razão e Política”, a mais recente da autoria do Prof. Pedro Rosa Ferro.

O Prof. Miguel Morgado, Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, inaugurou a sessão, comentando que “o convite para prefaciar o livro foi muito lisonjeador. Fui Professor do Pedro, mas nunca o vi com um aluno, mas sempre como um par de discussão aberta, livre, sobre os grandes temas da filosofia política.” O Professor coloca a sua aprendizagem dos grandes debates de filosofia política ao serviço da compreensão de grandes temas do nosso tempo. E isso é sempre uma novidade: levar essa reflexão um passo mais à frente com o auxílio dos grandes mestres do passado e tentar compreender aquilo que nos está a acontecer agora, para mim é sempre refrescante. Só por isso digo que já é importante.”


O papel libertador dos mestres na “modernidade líquida”
Num tempo em que se fala de “escassez de mestres”, o Prof. Miguel Morgado recorreu à metáfora da “arte agrícola”: “para termos uma árvore de onde nascem mais frutos, precisamos de tratar bem, primeiro, da terra, onde vamos semeá-la. Precisamos de adubá-la, arejá-la, irrigá-la. Talvez a analogia funcione nos nossos tempos: precisamos de preservar as nossas instituições de aprendizagem e conhecimento científico, libertá-las das pressões ideológicas, que neste momento as esmagam. Porque se convertemos pura e simplesmente a academia numa câmara de ressonância dos preconceitos políticos não teremos mestres, com certeza.”

“Adquirimos imediatamente benefício ao adquirirmos consciência da condição em que vivemos hoje, marcada pelo conceito do sociólogo Bauman: uma fluidez cada vez maior de instituições, práticas e valores.” O convidado apontou para a necessidade de fazermos com que essa realidade se reflita em nós e tenhamos a consciência crítica daquilo que ela é. Depois, há que compreender que esta condição não é um dado imposto pelo destino, ao qual estamos condenados a sobreviver nela, mas que é mais contingente do que possa parecer. Com esta consciência global, adquirimos os instrumentos intelectuais, políticos e morais para superar a condição de modernidade líquida”, “que nunca é consumada no espaço de uma geração”.


O Prof. Pedro Rosa Ferro desvendou numa entrevista da AESE, o principal móbil de “Caminhar sobre a água”, à luz da Fé, da Razão e da Política.


O que o inspirou a escrever este livro?
O que me leva a escrever é uma certa necessidade de arrumar ideias, de tomar posição, de fazer frente às contínuas “provocações” da vida: acontecimentos, experiências, contraste com diferentes visões do mundo… Eu penso a escrever, sobretudo, tal como outros pensam a ler, ou a falar, ou a ouvir.
Nesse processo, tendo a “olhar para a rua e olhar para a lua”, como dizia alguém, com uma disposição que se pode chamar de “wandering and wondering”: de exploração e inquietação, conducente umas vezes à indignação, outras à admiração. E tendo a comunicar ou partilhar através da escrita – em voz alta, por assim dizer – como costuma acontecer aos professores, aquilo que vou descobrindo ou que me impressiona.


A filosofia e a ética são importantes para a política e para o governo das organizações?
Grande parte das nossas obrigações político-morais surge do reconhecimento dos outros como seres humanos, iguais a nós, com a mesma dignidade (humana). Julgo que não se pode discutir razoavelmente aquilo que é justo, aquilo a que tem direito uma pessoa (o que lhe é devido, como pessoa humana) e qual é o seu dever, se não há um entendimento mínimo sobre o que é um ser humano, ou se a concepção de natureza humana – a nossa comum humanidade – for esvaziada de qualquer implicação moral. Nesse caso, seria difícil ajuizar sobre o significado prático da dignidade, liberdade, igualdade, justiça, cidadania, etc. A natureza humana – ou a condição humana – é a matéria-prima da política e do governo das organizações. Ninguém pode governar se não se interrogar sobre o que distingue aquilo que é nobre daquilo que é vil.


É possível aprender a “concordar em discordar” a bem da construção de instituições sustentáveis e duradouras?
Vivemos numa sociedade pluralista, em que se enfrentam visões do mundo diferentes. Um dos pontos do meu livro trata precisamente da dificuldade actual de “concordar em discordar” sobre essas visões conflituantes. Essa dificuldade resulta do facto de que qualquer “acordo no desacordo” pressupõe uma concordância prévia relativamente ao desacordo que não pode ser admitido sem destruir a base da comunicação. E é esse acordo mínimo que está hoje em causa nas sociedades ocidentais.
Não é evidentemente possível explicar aqui as raízes desta situação, nem adiantar os meios para a sua superação, se é que existem. Mas apontaria, em qualquer caso, alguns pressupostos para uma “discordância saudável”: a disponibilidade para a conversação racional e civilizada face a pontos de vista, valores e interesses rivais; o respeito, e mesmo simpatia, pela pessoa do interlocutor; e a consciência de que a igual consideração e respeito devidos a todas as pessoas, enquanto sujeitos morais, não implica a equivalência moral e intelectual entre todas e quaisquer escolhas, comportamento ou convicções.


A Doutrina Social da Igreja continua atual para a prática política e social dos nossos dias?
Como se sabe, a Doutrina Social da Igreja contem princípios de reflexão sobre a ordem social – família, trabalho, cultura, economia, política, relações internacionais…–, aponta critérios de juízo sobre sistemas, estruturas, práticas e situações sociais, e sugere directrizes de acção para orientar a actividade dos cristãos na vida social. Uma vez que o bem comum da sociedade humana está ao serviço das pessoas, os meios de acção devem ser conformes à dignidade da pessoa e favorecer a elevação da sua liberdade. Aqueles critérios, directrizes e princípios – nos quais se incluem a solidariedade, a subsidiariedade, o direito à propriedade, como espaço de liberdade individual e função social… –, continuam obviamente actuais. Mas precisam sempre de ser “actualizados” nas circunstâncias concretas de cada um. A esse propósito, julgo que mais importante do que a retórica banal sobre a “responsabilidade social” planetária é o sentido de responsabilidade pessoal face aquilo que está ao nosso alcance.


A apresentação do livro foi seguida de uma sessão de autógrafos e de um convívio entre os amigos presentes.

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