Quantas pessoas já lhe disseram que os dias parecem passar muito mais depressa do que sucedia há uns anos? Certamente muitas.
Efetivamente, a noção de tempo é hoje diferente do que era no passado. Tal não se deve certamente ao facto de o planeta Terra girar mais depressa e as 24 horas do dia terem atualmente menos milissegundos do que tinham em 2015 (1) . Acontece que a quantidade de informação com que os media e as redes sociais nos bombardeiam incessantemente provoca a real sensação de que tudo acontece demasiado rápido, com uma velocidade que dificilmente conseguimos acompanhar. Perante tão grande volume de informação, a divulgação de avanços tecnológicos e outras inovações impactantes passa muitas vezes despercebida, sobrepondo-se-lhe outras notícias mediáticas que o grande público paradoxalmente mais valoriza. Mas a verdade é que a tecnologia evolui também muito rapidamente e sentimos no nosso dia-a-dia os seus efeitos, a que chamamos “progresso”.
Se nos pedirem para enunciar as principais invenções de cariz tecnológico do século passado, com facilidade identificamos marcos que mudaram o modo como vivemos e trabalhamos, alterando comportamentos e modelos de interação social, com impacto muito significativo na economia global e elevado potencial transformador a médio-longo prazo (2): lembramo-nos de imediato do computador pessoal (vulgo PC), da rádio e televisão, do avião comercial e da energia nuclear, entre outras. Nas primeiras duas décadas do século XXI, a tecnologia de Blockchain, os Veículos Elétricos e Autónomos, as tecnologias imersivas de Realidade Virtual (RV) e Realidade Aumentada (RA), a Impressão 3D Avançada, a edição precisa do DNA (3), as vacinas de RNA Mensageiro e a Inteligência Artificial são apenas mais algumas importantes manifestações da criatividade humana e de tecnologias emergentes ao serviço da humanidade.
O ano 2023 também testemunhou avanços significativos na interseção entre Operações, Tecnologia e Inovação (OTI). A segunda onda de transformação digital (caracterizada pelo aprimoramento e expansão das tecnologias digitais nas organizações, com foco na integração entre canais físicos e digitais), a par do aperfeiçoamento da Inteligência Artificial adaptativa (que possui capacidade para rever o seu próprio código e modificar estratégias de tomada de decisão para melhor se adaptar ao contexto), destacaram-se neste período como importantes fatores de melhoria na gestão de operações. Importa lembrar que a inovação não se limita exclusivamente à implementação de avanços tecnológicos, abrangendo a conceção de novos modelos de negócio, métodos de trabalho e práticas inovadoras geradoras de valor. Diversas foram as iniciativas inovadoras implementadas em várias organizações positivas que constituem casos de sucesso, também em Portugal.
Destacaria três desenvolvimentos no domínio OTI que, em 2023 e à escala global, deram um importante contributo para a melhoria da eficiência em diversos setores de atividade económica e social:
- Acentuação da tendência para integrar o Cliente nos processos digitais das organizações – promove uma interação mais direta e personalizada entre o prestador de serviço e o(s) seu(s) destinatário(s), contribuindo para reforçar o relacionamento interpessoal e institucional, melhorar a experiência do Cliente e a eficiência operacional.
- Consolidação da tecnologia blockchain na gestão de transações e acesso seguro a informação – proporciona maior transparência e segurança nas transações comerciais e outras, o que contribui para reforçar a confiança nas instituições e proporcionar maior fiabilidade no acesso controlado à informação.
- Incremento da eficiência dos processos de rastreabilidade de produto em contexto logístico – permite otimizar operações de natureza logística, contribuindo para reduzir custos, incrementar a confiabilidade nas cadeias de abastecimento e assegurar maior eficácia na gestão de stocks.
Deixo uma questão para reflexão do leitor: referi anteriormente (2) que “os limites da «imaginação aplicada» são a criatividade, as leis dos homens e o tempo de operacionalizar” – na verdade, de que vale conceber um carro voador que não pode voar porque não existe infraestrutura disponível nem enquadramento legal para a sua utilização?
1) A Terra começou a acelerar em 2016, no seu movimento de rotação em torno do sol, sendo que em 2020 o planeta Terra registou os 28 dias mais curtos de que se tem conhecimento desde que os relógios atômicos começaram a ser utilizados (na década de sessenta). O dia 29 de junho de 2022 foi o dia mais curto da história, com menos 1,59 milissegundos do que é normal.
2) Uma das consequências da rapidez com que hoje tudo acontece resulta na alteração do conceito de “longo prazo”: atualmente, 2 a 3 anos podem significar um prazo realmente longo quando falamos de inovação e desenvolvimento tecnológico. Pensarmos em carros voadores (o primeiro protótipo de carro voador foi apresentado pela fabricante chinesa XPeng AeroHT em outubro de 2022), ou em simbiose tecnológica onde a IA e o cérebro humano podem colaborar (pesquisas científicas recentes assinalam avanços significativos na reprodução de características do cérebro humano, como neurónios artificiais multissensoriais), podem de facto ser realidades num futuro muito próximo (quiçá no que podemos designar por “curto prazo”). Comentando a conhecida frase “a imaginação não tem limites”, atrevo-me a sugerir a seguinte variante: “os limites da «imaginação aplicada» são a criatividade, as leis dos homens e o tempo de operacionalizar”.
3) O sistema CRISPR-Cas9 é uma técnica de edição genética que permite modificar genes de forma precisa (CRISPR refere-se a “Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats,” – sequências de DNA específicas; “Cas9″ é uma proteína associada que funciona como uma tesoura molecular, truncando o DNA na sequência pretendida).
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Maria de Fátima Carioca
Professora de Fator Humano na Organização e Dean da AESE Business School
O ano da desética
Pedro Alvito
Professor da Área Académica de Política de Empresa e Diretor do Short Program Construir o Futuro nas Empresas Familiares
Navega o futuro, ontem
Eurico Nobre
Professor de Política Comercial e Marketing da AESE Business School