Os jovens diplomados não emigram apenas pelos baixos salários praticados, muitos desejam simplesmente ter uma “vida normal”. Esta é uma geração com receio de ter filhos, pobre e desconsiderada.
Após termos reunido cerca de um milhão e meio de jovens no nosso país, durante as JMJ, a mensagem política sobre o futuro, que o Estado laico tem para dar aos jovens licenciados portugueses, parece ser a da emigração.
Notícias recentes revelam que existe de facto um êxodo de jovens diplomados para o estrangeiro. Saem do país à procura de melhores salários, maior reconhecimento e melhor qualidade de vida.
Perante esta autêntica “hemorragia social”, o governo decide aplicar um penso rápido. O primeiro-ministro anunciou que, por cada ano de trabalho em Portugal, vai devolver um ano de propinas pagas numa universidade pública do país, o correspondente a 697 euros. Foram ainda anunciadas algumas medidas no IRS Jovem, com bonificações nos primeiros anos de trabalho e a oferta de uma viagem, em parceria com a CP e as pousadas de juventude para conhecer a diversidade e beleza do país.
Para muitos, esta será provavelmente uma viagem de despedida, pois o destino de milhares de jovens está traçado: emigrar para trabalhar fora do país. Perante esta fatalidade, as famílias sofrem impotentes, uma vez que não foi este o país que os pais sonharam para os seus filhos.
Os salários baixos e a falta de reconhecimento das competências profissionais são dois fatores que levam os jovens a emigrar, mas não são os únicos. A falta de qualidade de vida é muitas vezes apontada como um dos motivos que leva à saída do país.
Já há vários anos que acompanho jovens diplomados que entram no mercado de trabalho. As principais queixas reportadas referem-se ao autêntico sequestro que sentem pelo trabalho, devido ao excessivo número de horas de trabalho presencial e à enorme pressão psicológica no contexto profissional.
Infelizmente, o excesso de carga horária é prática comum em várias empresas e grandes escritórios de advogados, uma vez que exigem 12-14 horas de trabalho diário presencial. Começa aqui a primeira grande desilusão. Subitamente estes jovens tomam consciência de que perderam a liberdade; a vida pessoal fica adiada. Dispor tempo para o desporto, atividades de lazer, convívio com os amigos e a família, torna-se praticamente impossível.
Este é um problema cultural do nosso país que deve ser combatido, pois a presença prolongada no local de trabalho não se traduz em maior produtividade. É um caminho errado que retira qualidade de vida aos jovens, dificulta a conciliação trabalho-família, constituindo um fator que leva frequentemente a um aumento de doenças psiquiátricas e a uma sociedade de “berços vazios” (envelhecida e sem crianças).
Curiosamente, durante a JMJ, o Papa Francisco abordou este assunto no discurso que fez no CCB: ”E o futuro são os jovens … os ritmos frenéticos em que se veem imersos, o aumento do custo de vida, a dificuldade de encontrar uma casa e, ainda mais preocupante, o medo de constituir família e trazer filhos ao mundo”.
Do meu ponto de vista, os jovens diplomados não emigram apenas pelos baixos salários praticados em Portugal, muitos desejam simplesmente ter uma “vida normal”. Esta é uma geração com receio de ter filhos, pobre, deprimida e desconsiderada. Nunca é demais denunciar estes abusos à dignidade humana. Pelos vistos o governo não os compreende, já que não se resolvem pela via do IRS bonificado ou com a oferta de bilhetes da CP para visitar a beleza paisagística nacional.
Os jovens atualmente são capturados por um sistema que considera o lucro como um dogma do desenvolvimento económico e a concorrência sem limites como um motor essencial do progresso. Para alcançar estes objetivos, as pessoas são “coisificadas”, desprovidas de direitos sobre a sua uma vida pessoal e familiar, transformadas numa peça de um mecanismo industrial produtivo que alimenta a economia, mas que deslaça as famílias, através da emigração forçada das gerações mais jovens, e nos humilha a todos, todos, todos.
Artigo publicado no Observador