A contabilidade também é um recurso para avaliarmos a performance do negócio.
O conhecimento das principais técnicas utilizadas na elaboração das demonstrações financeiras possibilita aos gestores das empresas uma leitura crítica da informação contabilística e uma avaliação da performance do negócio. É um aspeto crucial no processo de análise da situação do negócio e na tomada de decisões de gestão corrente e estratégica. Sabendo quais são as principais – e frequentes – falhas no sistema de informação contabilística pode-se mitigar esses erros e omissões, contribuindo assim para o sucesso e a continuidade da organização. Em resumo, conhecer melhor para melhor decidir.
As principais demonstrações financeiras – balanço, demonstração de resultados, demonstração de fluxos de caixa – possibilitam aos seus utilizadores (sócios ou acionistas, Estado, colaboradores, clientes, fornecedores e instituições financeiras) obter informação sobre a situação patrimonial (dada pelo balanço), performance económica (dada pela demonstração de resultados) e performance financeira (dada pela demonstração de fluxos de caixa) da empresa.
O tecido empresarial português é constituído maioritariamente por pequenas empresas Segundo os Quadros do Setor do Banco de Portugal. No ano de 2020, 89% das empresas em Portugal eram microentidades, ou seja, tinham até 10 trabalhadores e faturaram até 500 mil euros. Verificámos, na nossa investigação que as principais rubricas identificadas nas contabilidades das microentidades são:
- os investimentos em ativos usados na produção ou comercialização de bens e/ ou serviços, em que seja expectável a sua utilização por um período superior a 12 meses (denominados com Ativos Fixos tangíveis);
- os ativos não monetários, sem substância física, tais como goodwill, despesas de investigação e desenvolvimento, propriedade industrial (denominados de Ativos Intangíveis);
- As mercadorias adquiridas para venda e os produtos que a empresa produz e detém para venda no decurso normal da sua atividade (denominados de Inventários de mercadorias, matérias-primas, produtos em curso e produtos acabados);
- Os direitos contratuais de receber dinheiro, ativos financeiros ou outros benefícios económicos de outras entidades (denominado de Clientes e outras contas a receber);
- Os ativos financeiros monetários que compreendem valores em caixa, depósitos à ordem e a prazo, bem como outros instrumentos financeiros (denominados de Disponibilidades);
- Passivos financeiros que compreendem obrigações contratuais de pagar dinheiro ou outro ativo financeiro a outra entidade (denominados por Fornecedores, Financiamentos Obtidos e outras contas a pagar);
- As vendas de mercadorias, prestação de serviços e rendimentos provenientes do uso por terceiros de outros ativos da empresa – como sejam os juros, royalties e dividendos (denominado de Rédito);
- Os gastos associados aos recursos gastos nas atividades correntes da empresa, como são os casos dos “custos das mercadorias vendidas e materiais consumidos”, dos “fornecimentos e serviços externos”, dos “gastos com o pessoal” e das “depreciações” (denominados de Gastos);
- Situação líquida correspondente ao excedente do valor do património líquido depois de solvidas todas as dívidas (passivo) da empresa. São créditos dos sócios ou acionistas que se justificam principalmente pelas seguintes parcelas: capital social subscrito pelos sócios/ acionistas aquando da constituição da sociedade e nos aumentos de capital; resultados transitados de exercícios anteriores e retidos na entidade; resultados do próprio período; excedentes de revalorização dos ativos; e reservas legais que são parte dos resultados líquidos que ficam retidos na empresa sem possibilidade da sua distribuição aos detentores do capital social (denominado de Capitais Próprios).
O processo de produção da informação contabilística não está isento de erros ou omissões, efetivamente, são frequentemente observadas falhas que causam distorções na leitura das informações financeiras. Estes erros têm a sua origem na não adoção das boas práticas contabilísticas no mundo empresarial, são exemplos destas falhas:
- Inadequados procedimentos de conferência de saldos de contas de clientes, fornecedores e outras contas a receber e a pagar poderá não detetar recebimentos ou pagamentos registados em contas correntes erradas. Levadas ao extremo poderá não detetar a prática de fraude;
- Alterar registos contabilísticos em exercícios económicos já encerrados e reportados à Autoridade Tributária, poderá dar origem a coimas e multas para empresa. Ou seja, a contabilidade do ano de 2022 está encerrada, mas por motivos de gestão foram alterados os registos em 2024;
- Não elaborar reconciliações entre o extrato bancário e os registos contabilísticos com uma frequência semanal ou mensal. A prática de reconciliação bancária regular permite detetar erros na informação contabilística e corrigi-los atempadamente, bem como mitigar a ocorrência de fraudes;
- Registo de saídas de stocks sem existir inventário causando o registo de quantidades negativas no sistema de gestão de stocks. Por razões comerciais o produto comprado para determinado cliente não foi registado no software de gestão de inventário (como entrada em armazém) e foi faturado e enviado imediatamente para o cliente (registando uma saída de armazém). Em resultado o stock ficou negativo;
- Transações de balanço são registadas erradamente na demonstração de resultados. Devido à inexperiência de alguns contabilistas, operações tais como compra de ativos, pagamentos de dívidas a pagar, retiradas de sócios ou distribuição de lucros poderão ser registadas como gastos. O mesmo aplica-se no caso da contratação de financiamentos para a empresa, onde poderão ser registados como rendimentos na contabilidade.
- Com o advento da era digital e implementação de procedimentos de automação para maior simplificação do trabalho dos departamentos financeiros das empresas (leitura e contabilização de documentos para contabilidade, importação de documentos de compra pela integração da informação constante no EFATURA) não significa que a informação integrada é sempre corretamente classificada nas contas da empresa. É sempre necessário validar que as sugestões do software de contabilidade para os registos contabilísticos seguem a políticas geralmente aceites em Portugal e que os impostos são corretamente registados e tratados à luz da legislação portuguesa.
- Igualmente importante é a revisão regular – por elementos da Administração – dos saldos de todas as contas (através da análise dos balancetes mensais), em especial das contas com os valores mais significativos. Este procedimento permite aferir se o que está no papel está alinhado com a realidade. O conhecimento e a visão global da Administração permite muitas vezes identificar números excessivos ou números em falta relativamente a determinados ativos, devedores, credores ou contas de acréscimos e diferimentos.
A correta leitura, análise e retificação das demonstrações financeiras exige um conhecimento sólido do modelo de registo, dos conceitos e das técnicas contabilísticas usadas para reconhecer e mensurar os acontecimentos da vida empresarial. Como errar é humano, os dirigentes devem estar preparados e conscientes dos pontos fracos e das falhas mais frequentes do sistema de registo e controlo económico e financeiro de forma a corrigir ou evitar tais situações. O pleno conhecimento dos riscos e dos erros cometidos frequentemente no passado contribui para minimizar a sua ocorrência no presente, tornando a informação económica e financeira mais fidedigna e verdadeira.