O sucesso francês no negócio do vinho do Porto
José Ramalho Fontes
Presidente da AESE Business School e Professor de Operações, Tecnologia e Inovação
Muito poucas pessoas saberão que a La Martiniquaise é o líder mundial no negócio do vinho do Porto. De origem francesa, tem como marca de bandeira o Porto Cruz e a sua feliz imagem da mulher de negro, de Portugal onde o negro é cor, afirma. Menos pessoas saberão ainda que é um dos dez maiores grupos de bebidas a nível mundial e o segundo maior grupo francês de bebidas espirituosas. Esta empresa familiar tem como presidente atual Jean Pierre Cayard, filho do fundador.
Como é que esta empresa alcançou a liderança, na última década, num produto e mercado que toda a gente associa às empresas e tradições britânicas? A resposta é simples, mas inesperada. Recordemos, primeiro, que o vinho do Porto foi produzido no Douro e envelhecido nas caves de Vila Nova de Gaia, durante séculos, e as empresas britânicas – entre outras -, simples comerciantes de granel, engarrafadores e produtores engarrafadores, exportavam-no para os diversos mercados, onde era engarrafado e vendido a consumidores seletos, sem prejuízo de haver também alguns produtores e engarrafadores portugueses.
Depois, a partir dos anos 60, a grande distribuição nos países europeus mais desenvolvidos descobriu que, para além dos clientes tradicionais, havia procura para o Vinho do Porto para ser consumido em momentos festivos e celebrações, mas com preços inferiores ao prestígio e perceção do produto. Como resposta muitos operadores em diferentes países, a partir do granel conseguiram colocar no mercado produtos em que se trocava margem por volume. Foi o que aconteceu em França, onde a La Martiniquaise tinha uma grande rede de supermercados. Com vinhos do Porto estagiados por terceiros e comprados a granel, no entreposto de Gaia, a comerciantes e adegas cooperativas, muitos deles pequenos, até 1975 seguiu o modelo tradicional e engarrafava em Paris. A lógica era trabalhar com grandes volumes, com o grosso da oferta centrada nas categorias de entrada de gama para as suas lojas.
Seguindo as boas regras do marketing, criou uma marca, desenvolveu uma imagem forte e atingiu um volume cada vez mais elevado, explorando o prestígio do produto e os hábitos tradicionais. Em 1975, concentrou toda a sua operação de engarrafamento em Gaia, antecipando em cerca de duas décadas o final da exportação a granel. Nessa data, prevendo dificuldades de aprovisionamento, adquiriu a Manuel R. Assunção & Filhos, proprietária da marca Porto Cabral e com uma boa carteira de clientes nos Estados Unidos e Canadá, que passou a usar a razão social Gran Cruz Porto. Em 2007, comprou a empresa C. da Silva, com as marcas Dalva, Presidential, e com stocks de vinhos brancos velhos, começando também a vinificar na respetiva adega.
Com a morte do seu administrador histórico, em 2007, Jean Pierre Cayard, convidou Jorge Dias, em finais de 2008, à época com 47 anos, para assumir o comando da Gran Cruz. Duriense de Santa Marta de Penaguião, engenheiro agrónomo com um perfil académico, passagens pelo Governo e IVDP – Instituto do Vinho do Douro e Porto, e um dos autores da candidatura do Douro a Património da Humanidade, já tinha feito tudo no vinho do Porto, mas faltava-lhe dirigir uma empresa. Aceitou o convite!
Cayard veio a Gaia, apresentou-lhe a equipa e apresentou-o à equipa e regressou a Paris, deixando-lhe nas mãos a tarefa de transformar um punhado de empresas formatadas para o negócio dos séculos passados, num grupo competitivo e num mercado em que o vinho do Porto continuava a perder volume e faturação, embora em proporções diferentes.
Não pretendendo pormenorizar cada um dos passos dados por Jorge Dias, até à atualidade (Cf. DG-A-1796 – Como Jorge Dias deu a volta à Gran Cruz, AESE, 2023), é de destacar que procurou fortalecer a relação direta com os viticultores e, mantendo o vinho do Porto como base, aumentou a produção de vinhos DOC Douro. Por outro lado, quis abrir o vinho do Porto às gerações de consumidores mais jovens, limpando teias de aranha e oferecendo novos produtos: o Porto Pink, por exemplo, em que a Gran Cruz vende 600 mil garrafas por ano, 60% do mercado. E, também, abriu um centro de provas na Marginal de Gaia, a par de toda a concorrência, mas com um modelo diferente sem caves.
Contudo, a maior marca mundial de vinho do Porto, a Porto Cruz, não se podia esgotar na imagem elegante da mulher de negro e ficar escondida atrás de empresas com nomes incaracterístico e sem marca comercial, sem notoriedade. Para isso, ao longo de 2022, fundiu as diversas empresas numa nova – Granvinhos – e aproveitou esses movimentos para adquirir outras empresas do setor dos vinhos e diversificar regiões vitícolas, e oferecer novos produtos, como licores, por exemplo. Com estas operações, pôde apresentar-se no mercado, no final de 2022, com a faturação consolidada de cerca de 110 milhões de euros, evidenciando a sua liderança.
Contudo, esta mudança necessitava de um símbolo e aspirava a um propósito. O símbolo surgiu, maior do que o desejado, e tem o nome de Quinta do Ventozelo, adquirida em 2012. Com 600 hectares de área e 400 hectares de vinha, foi transformada no ex-libris da Granvinhos, no coração da empresa e numa joia do enoturismo da RDD, Região Demarcada do Douro.
O propósito também se apoiou na Quinta, pela constituição da associação dos Amigos de Ventozelo, um think-tank que tem como missão alavancar a RDD para outro patamar: sem desvirtuar a essência do trabalho já realizado por muitos, no passado, quer propor novos desafios que, tal como os vinhos da região, estejam constituídos por ‘uvas de vinhas velhas’ de alta qualidade, com ‘uvas novas’ produzidas de forma sustentável num ecossistema com notoriedade mundial acrescida.
Há dias, um líder de uma das empresas de matriz britânica, confessou-me que, em 2008, jamais acreditaria que a Gran Cruz atingisse a situação atual. Nessa altura, Jean Pierre Cayard tinha-lhe proposto que ele fosse o principal fornecedor de vinho do Porto da Gran Cruz, proposta não aceite pelo alto volume desejado.
A Quinta do Ventozelo central no caso da AESE, DG-A-1796 – Como Jorge Dias deu a volta à Gran Cruz, é também significativa do projeto CV3, Criar Valor na Vinha e no Vinho que a AESE vem desenvolvendo nos últimos anos para aumentar a competitividade deste ecossistema com um potencial elevado de crescimento. Simbólica, porque forneceu o vinho do jantar de celebração dos 40 anos da AESE, e significativa porque traduz o potencial escondido deste ecossistema, que se vem explicitando nos casos já produzidos – Aveleda, Lavradores de Feitoria, Mateus, Casa Ermelinda Freitas, Casa Relvas, Douro Boys, etc. – e nos vários estudos realizados sobre Hábitos de Consumo, o Mercado Americano, a Criação e Gestão do conhecimento, etc.
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