Agostinho Abrunhosa
Diretor do Executive MBA AESE e Professor de Operações e Tecnologia na AESE Business School
Vivemos no limiar de uma mudança significativa e acelerada. A tecnologia está cada vez mais presente na nossa vida, tanto a nível pessoal como profissional, misturando e alavancando os mundos físicos e digital. Algumas organizações conseguem fazer a transformação digital e outras não. É importante estudar o que promove o sucesso e as causas profundas dos falhanços.
A verdadeira transformação digital só pode ser alcançada quando a tecnologia e a cultura estão em sintonia, criando a mentalidade digital necessária não só para implementar as soluções corretas, mas também para a cultura organizacional certa acelerar a mudança tecnológica. Ser digital é mais do que a tecnologia que se implementa; é o próprio carácter dessa organização.
O que dizem os líderes
O estudo da Harvard Business School, Leadership in the Digital Era (2022)[1], feito a mais de 1.500 líderes, mostrou que 97% “Concorda ou concorda fortemente que as empresas não irão manter-se competitivas a não ser que façam uma transformação digital” e apenas 47% “Acreditam que suas organizações têm o talento certo para competir na era digital”. Na prática não há dúvida do que é preciso para ser mais competitivo e que o grande desafio está no talento que é preciso desenvolver ou contratar.
O mesmo estudo mostra as principais qualidades que as organizações devem seguir para ter sucesso: Tomada de decisão informada por dados (61%); Foco no cliente (55%); Colaboração multifuncional (51%) e Aprendizagem Contínua (44%).. Estas qualidades estão bem alinhadas com o framework detalhado mais adiante.
O estudo permite ver a importância do digital e um conjunto de metodologias e iniciativas que podem ajudar a preencher o gap entre o estado atual das organizações e a visão desejada para amanhã.
Um pouco de história
No início dos anos 1900, a eletricidade mudou o mundo dos negócios. Tudo o que podia ser eletrificado – berbequins, máquinas de lavar loiça, relógios, máquinas – foi eletrificado. A revolução da eletricidade reformulou o mundo dos negócios e abriu novas oportunidades de negócio, produtos e eficiências.
No final do século XX, duas outras invenções – o computador pessoal e a internet – transformaram radicalmente os negócios. Já neste século, o smartphone e a cloud trouxeram novas ondas de choque, em cima das anteriores. Nasceram as primeiras empresas de um trilião de dólares do mundo, a Apple e a Amazon. Hoje, muitos indicadores económicos, políticos e tecnológicos sugerem que nos encontramos no precipício de outra mudança acelerada pela AI, cujo chatGPT é o sinal mais visível. A Nvidia, empresa que apostou forte na AI, tornou-se recentemente numa trilion dólar company.
As tecnologias que permitem a disrupção e trarão múltiplas transformações. Nos próximos anos, o mundo dos negócios, as sociedades e as nossas vidas irão sofrer mudanças imprevistas. Essas alterações forçam a mudança das estratégias organizacionais, que por sua vez têm de adaptar o seu modelo organizativo e as competências das suas pessoas. Desenvolver um mindset digital permitirá antecipar, compreender e aproveitar melhor essas mudanças.
O que é um mindset digital e porque é importante?
Muitos defendem a importância de se desenvolver uma mentalidade digital. No entanto, o termo é frequentemente uma buzzword. Quando se pede para se descrever o verdadeiro significado de uma mentalidade digital, referem-se capacidades organizacionais, como a capacidade de falhar, de testar novas ideias ou de ser ágil e colaborativo. Outros relacionam uma mentalidade digital com a existência de estruturas e processos organizacionais que apoiam a colaboração, a inovação, a partilha de conhecimentos, a melhoria contínua, a agilidade, a flexibilidade e a perceção, de que a tecnologia digital é um pilar estratégico da organização.
Um mindset é um conjunto de crenças, ideias, perspetivas e pressupostos que influenciam a forma como vemos o mundo. É também uma hierarquização na medida em damos mais importância a umas que a outras. Por seu turno esse conjunto de crenças, e os valores associados, determinam as práticas, ou seja aquilo que se faz, ou como se faz. A estratégia organizacional é ‘o trabalho que é preciso ser feito’ e que a cultura ‘é a forma como o trabalho é feito’. É comum a expressão ‘A cultura come a estratégia ao pequeno-almoço”.
Meta-competências da transformação digital
Os Prof. do IESE E. Kaganer e R. Gregory, criaram um framework (Figura 1) que parte de um conjunto de beliefs e se reflete nas respetivas práticas organizacionais que permitem materializar essas crenças. Todas as crenças e as práticas têm valor em si próprias e em conjunto podem fazer parte de um roadmap de transformação digital.
Figura 1.
A regra dos 30%
No livro “The Digital Mindset”[2], os autores defendem que a fluência e não o domínio é o objetivo certo. A sua ideia de que “Só é necessário cerca de 30 por cento de fluência num punhado de tópicos para desenvolver a sua mentalidade digital”, é central para a primeira parte do livro. Leonardi e Neeley argumentam que os dirigentes não precisam de dominar assuntos técnicos. Eles precisam de “compreender o que os programadores e cientistas de dados fazem, e ter uma compreensão proficiente de como funciona a aprendizagem automática, como utilizar os testes A/B, como interpretar modelos estatísticos e como como conseguir que um chatbot baseado em IA faça o que o que precisa de fazer”. A regra dos 30% é derivada da ideia de que para dominar o inglês é necessário conhecer 12.000 palavras, mas para ser fluente basta conhecer 3.600 (30%).
Processo de mudança do mindset
Começa muitas vezes pela vontade e empenho em obter novas competências ou de conhecer melhor certos fenómenos que nos rodeiam. A leitura de um livro, a conversa com um especialista, a participação num programa de formação de executivos são formas de aprender, aprofundar ideias, debater, conhecer e compreender a realidade. Esse desenvolvimento e conhecimentos adquiridos permite ver o mundo com outros olhos. Recordo durante o MBA que após ler casos de certas indústrias começava a ver coisas que antes eram invisíveis para mim.
Por seu turno ver o mundo, a realidade dos negócios, das empresas e da tecnologia com outros ‘olhos’ alarga os horizontes e juntar os pontos que permitem mudar comportamentos. Essa mudança reflete-se na forma como colaboramos com os outros, como vemos a tecnologia e como fazemos a mudança, para melhor, seja pessoal seja nas organizações em que trabalhamos.
Esse processo de mudança permite-nos conhecer e usar melhor os recursos do mundo digital para facilitar e acelerar a nossa eficácia e eficiência no mundo físico. Por seu turno o mundo físico cada vez mais tem um reflexo no mundo digital fruto da desmaterialização, aumentando a densidade digital.
O papel do líder
Não chega investir em tecnologia. É necessário criar uma visão clara sobre a forma como as pessoas devem trabalhar, partilhar informação, colaborar, tomar decisões, ser criativos e com critério, sendo ágeis e flexíveis. É preciso que ajudem a identificar os gaps existentes para atingir essa visão, que participem no planeamento, na execução das medidas e na monitorização dos resultados. Devem liderar pelo exemplo, sublinhar os comportamentos adequados, recrutar e dar formação nas áreas respetivas, reforçando todas as iniciativas que sejam coerentes e alinhadas com a cultura e o mindset desejado.
Só quando se cultiva plenamente a mentalidade correta é que se criam as condições para que a cultura correta floresça e passe de meramente se fazerem coisas digitais para se ser verdadeiramente digital, no sentido mais amplo do conceito.
[1] http://hbswk.hbs.edu/item/leading-in-the-digital-era-where-can-digital-transformation-take-you
[2] http://www.amazon.com/Digital-Mindset-Really-Thrive-Algorithms/dp/1647820103
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Diretor de Sustentabilidade da JLM&A e Professor de Estratégia, Sustentabilidade e Política de Empresa na AESE Business School
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